Tendência é de que bancos repassem aumento da taxa básica de juros ao consumidor. Embora sutil, elevação já pode ser sentida em algumas instituições financeiras.
As projeções do mercado financeiro para a inflação em 2021 se distanciam cada vez mais do teto da meta perseguida pelo Banco Central (BC) para o ano, que é de 5,25%. Com isso, o consumidor já pode sentir o reflexo do aumento nas taxas de juros de financiamentos e empréstimos pessoais em algumas instituições financeiras.
De acordo com dados do Procon, de seis bancos pesquisados — Banco do Brasil, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Itaú, Safra e Santander — a única instituição que promoveu alteração nas taxas de empréstimos foi o Bradesco: de 7,22% para 7,42%, de junho para julho. O aumento, entretanto, pode ser um anúncio de que, em um futuro próximo, as instituições financeiras repassarão a alta taxa básica de juros da Economia (Selic) para o consumidor.
Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o próprio presidente do BC, Roberto Campos Neto, reconheceu que a taxa básica de juros terá de subir a um nível acima do esperado para o cumprimento da meta de inflação de 2022, hoje em 3,8%. Segundo o relatório Focus divulgado ontem pelo BC, a previsão para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para 2021 subiu novamente, de 6,31% para 6,56%. Com isso, a previsão dos economistas de instituições financeiras é de que a Selic, hoje em 4,25%, feche em 7% ao ano.
Nicola Tingas, economista chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, afiram que o Banco Central terá um verdadeiro desafio pela frente na condução da taxa de juros. “Uma vez que o país ainda se recupera economicamente e a renda líquida das famílias, principalmente, de baixa renda, diminui a cada dia, o BC terá que ser um grande maestro nessa jornada para conseguir fazer a normatização da melhor forma. Terá que avaliar em qual ritmo e aceleração a inflação estará no segundo semestre e qual será a dinâmica no próximo ano”, afirma.
Segundo o especialista, apesar do aumento dos juros, o crédito também é afetado positivamente pelo crescimento da economia, pois com a geração de empregos e a retomada econômica, os riscos de inadimplência diminuem. Para ele, o reflexo da taxa básica de juros na camada de crédito não será tão intenso para o consumidor, mas impactará no fluxo de caixa dos bancos. “A alta contínua da Selic vai conduzir as taxas longas de juros, e esse aumento virá no custo nominal, mas não estamos falando de altas extremamente expressivas, como já ocorreu no passado”, diz.
Embora não seja extremamente expressiva, a alta para financiamento de imóveis no Santander, por exemplo, já pode ser percebida. O banco elevou a taxa de juros, que era de 6,99% somados à Taxa Referencial (TR), que no momento encontra-se zerada, para 7,99% ao ano para a sua única modalidade de financiamento imobiliário.
Já o Bradesco elevou os juros em 0,2% em todas as categorias disponíveis para os clientes. Para os clientes Classic, foram de 6,9% ao ano para 7,3%. Já para clientes prime os juros permanecem em 6,9% ao ano, enquanto para os clientes Exclusive a taxa está em 7,1% a.a. O Itaú e o Banco do Brasil mantiveram suas taxas de juros para financiamentos imobiliários inalteradas.
Para Ricardo Rocha, professor de Finanças do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), aqueles que podem arcar com o financiamento não devem esperar, pois a tendência do mercado é que os juros aumentem. Contudo, ele explica que os aumentos não serão significativos.
“A maioria dos financiamentos de imóveis, hoje, oferece a Taxa Referencial mais juros, e essa modalidade só deve sentir algum reflexo real se a Selic chegar a 8% , o que é difícil. De toda forma, é melhor contratar um empréstimo hoje do que quando a Selic estiver mais alta”, afirma. Ainda segundo o professor, no ano que vem, o cenário poderá ser mais crítico. “Dificilmente a gente vai ver uma taxa de juros básica de dois dígitos esse ano, mas ano que vem haverá muita fervura, por conta das eleições”, alerta.
Pequenos empresários sentirão aumento dos juros indiretamente
Embora as pequenas e médias empresas tenham acesso a linhas de crédito diferenciadas, com taxas de juros bem menores do que as operadas para pessoas físicas, vale ressaltar que futuras alterações nas taxas de juros de créditos nas instituições financeiras atingirá essa categoria, uma vez que a inflação afeta a cadeira de consumo como um todo. De acordo com Giovanni Beviláqua, analista financeiro do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o aumento da Selic e o IPCA acima do teto poderão aumentar o nível de endividamento das famílias. “As famílias endividadas se tornam cautelosas com relação ao consumo, e isso impacta no retorno das atividades econômicas pelas empresas”, diz.
Para Beviláqua, ainda que a inflação tenha efeitos sobre as taxas de juros para os pequenos empresários, não deverão ser significativos. “Até maio, as taxas permaneceram estáveis, aumentaram um pouquinho relacionadas ao que eram no fim do ano passado. Ainda tem uma demanda por crédito muito elevada por parte dos pequenos negócios, principalmente pela retomada das atividades”, explica. Segundo ele, o novo Pronampe, por exemplo, opera com a taxa Selic + 6%, bem abaixo da média de mercado, que é 30%.
Fonte: Correio Braziliense