Crescimento do Produto Interno Bruto, caso haja, será pífio na avaliação de especialistas consultados pelo DC.
A inflação chegou aos dois dígitos – o que não acontecia desde 2015 – fechando 2021 em 10,06%. Acima dos 4,52% registrados em 2020 e muito acima do teto da meta para o ano, estimado pelo governo em 5,25%. Enquanto isso, as projeções para o PIB brasileiro de 2022 que chegam ao mercado são revistas a cada semana – sempre para baixo.
O segundo boletim Focus de 2022, divulgado pelo Banco Central no dia 10, aponta um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 0,28% ante os 0,36% projetados na primeira semana do ano. Números que podem até melhorar, mas o mercado não tem dúvidas de que o crescimento, caso haja, será pífio, e dificilmente a economia brasileira deixará de patinar.
Mas será que Minas Gerais, cuja economia se escora em grande parte na exportação de commodities, tem como se descolar deste já anunciado revés geral? Nesta conversa com três economistas mineiros, o DIÁRIO DO COMÉRCIO examina o contexto econômico nacional e seus reflexos na vida dos mineiros. Eles analisaram, com visões distintas, os números projetados para o próximo ano, a performance da economia mineira em relação ao restante do País, a pressão inflacionária, os juros e seus efeitos sobre o consumo das famílias.
Foram avaliados também os possíveis reflexos da política sobre a economia diante das eleições de 2022 que, segundo o economista Paulo Paiva, ex-ministro do Trabalho e do Planejamento e Orçamento no governo FHC, “são as mais importantes desde a redemocratização, quer para a economia, quer para a democracia”.
O professor da Fundação Dom Cabral e ex-ministro Paulo Paiva lança mão do relatório Focus, do Banco Central, publicado no início da semana, para listar algumas estimativas para a economia brasileira em 2022. Ali estão o PIB de 0,28% (e caindo) e a inflação (IPCA) de 5.03%. “O IPCA aparece significativamente menor do que os 10% do ano passado, uma queda consistente com a redução no crescimento da economia”, observa.
Outro dado é o da taxa Selic, prevista em 11,75% pelo Banco Central, confirmando assim a continuidade de sua política de austeridade monetária para conter a inflação, “em ano bastante desafiador, quer do ponto de vista político, quer do ponto de vista econômico”, pontua Paiva.
Para o economista, é muito pouco provável que a economia mineira se descole desse cenário, mesmo que o setor agropecuário, principalmente as exportações de grãos, tenha um desempenho positivo no primeiro semestre, como ele imagina. “Já o setor mineral dependerá do desempenho da economia internacional”, ressalta.
“Se o desempenho dos dois for suficientemente positivo, a economia mineira poderá ter um resultado maior do que a média nacional, mas isso não significa, de maneira alguma, um descolamento. Os fatores macroeconômicos (inflação, juros e câmbio) serão determinantes para o desempenho da economia em 2022”, avalia Paulo Paiva.
A inflação, segundo ele, estará submetida a tendências em dois sentidos opostos. De um lado, o baixo crescimento da economia, desemprego alto e rendimento do trabalho em queda, associados à alta de juros e redução de crédito, atuará para conter a expansão inflacionária. “Contudo, as incertezas no processo político, a volatilidade do câmbio e a falta de confiança na economia agirão para pressionar os preços para cima. O resultado líquido é incerto”, afirma
Os juros altos, certamente, irão afetar o consumo das famílias – o objetivo da elevação da Selic é justamente conter a demanda para reduzir a pressão sobre os preços. “Se, por hipótese, houvesse uma política fiscal mais responsável, o Banco Central teria mais espaço para flexibilizar a política monetária. Não é o que ocorre, muito menos, o que se pode esperar para o próximo ano”, lamenta o economista.
Para Paulo Paiva, o pior ainda não passou. Fatores que impedem o crescimento – como baixa produtividade, alto grau de desigualdade de renda e desequilíbrio fiscal – não se resolvem em um ano. “Dependem de reformas econômicas profundas e do apoio da sociedade para o País encontrar um caminho para o desenvolvimento, sustentável e inclusivo”, acredita.
De qualquer maneira, o processo eleitoral afetará o comportamento das principais variáveis econômicas neste ano e seu resultado ditará o caminho que o Brasil percorrerá no futuro, diz Paiva. “Essas eleições são as mais importantes desde a redemocratização, quer para a economia, quer para a democracia”, prevê.
Cenário pode afetar os investimentos neste ano
Professor de História Econômica e Economia de Empresas, Paulo Roberto Bretas não está otimista com a economia brasileira. “Sem investimentos e com redução de consumo, com expectativas de queda da atividade, ela de fato seguirá deprimida em 2022”, acredita Bretas.
Seu pessimismo com a economia brasileira se ampara em várias razões, desde a quebra de confiança com o desrespeito ao teto de gastos e o calote nos precatórios, até as questões inflacionárias e sua consequência de política monetária que é a subida dos juros. “Tudo isso forma uma conjuntura de baixo investimento, seja público ou privado”, define o economista.
Em relação à economia mineira, ele concorda com Paiva e vê chances de ela se desprender do triste contexto nacional, a partir de atividades como a mineração, que tem um peso considerável no PIB mineiro e de agropecuária, ambas voltadas para exportação. Justamente por isso, sua performance dependerá da retomada das economias da China, Europa e Estados Unidos.
A tendência de queda na inflação, medida por indicadores como IPCs e IGPs, pode ser contrariada por fatores altistas que, segundo Bretas, seguem visitando nossa economia. A subida do dólar, a política de preços da Petrobras – que aumenta o preço dos combustíveis, e as pressões do mercado externo não mostram sinais de arrefecimento.
“A projeção é de menos inflação para 2022, mas ainda em patamares altos para países emergentes, mesmo com a baixa intenção de consumo das famílias, que reduz pressões de demanda”, aponta o economista. Para ele, os juros altos, além de afetarem o consumo das famílias, também adiam investimentos, seja pela dificuldade de crédito barato ou pela oportunidade de ganhar dinheiro na renda fixa.
O setor financeiro e bancário, aliás, deve ganhar substância em 2022 com os juros elevados, assim como o de TI e a cadeia produtiva de saúde, enquanto a Covid-19 está em evidência. Já o comércio, diz Bretas, vai perdendo fôlego com a inflação e salários achatados, assim como os segmentos de Educação e bens duráveis.
“Acredito num bom desempenho da balança comercial, mas pode ser que tenhamos déficit em transações correntes em decorrência do comportamento dos investidores em ano eleitoral”, salienta Bretas, que é coordenador da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia – Núcleo Minas Gerais (Abed).
Para ele, os períodos eleitorais trazem mais gastos públicos e maior instabilidade, provocada pela insegurança de não se saber o que virá pela frente. “Vamos atravessar um período eleitoral em meio a uma crise econômica recessiva e inflacionária, com uma pandemia que não está debelada”, diz Bretas, para quem “o pior nunca passa se você continuar cavando o buraco”
E, no caso do Brasil, segundo ele, o buraco é enorme, cavado por mazelas como o desemprego elevado, pobreza quase endêmica, desindustrialização precoce, baixa produtividade geral, muita concentração de renda, evasão escolar a partir do nível médio, devastação ambiental, elevado grau de endividamento público.
Mas o que fazer? “Primeiramente não se apegar a ideologias, que não trazem soluções, porque se apegam a lendas e mitos. Não há economia de mercado que não se desenvolva sem um estado parceiro de qualidade, capaz de investir com a iniciativa privada, mas também fornecendo crédito para atividades a serem incentivadas. O Brasil precisa de um pacto solidário entre as classes sociais”, diz Bretas.
É necessário requalificar o Estado brasileiro, diz o economista, reduzindo desperdícios, mordomias e gastos desnecessários. “Sabe-se que há setores da administração pública que precisam de reformas e até da contratação de mais pessoas. Contudo, ninguém aceita pagar por uma máquina pública inchada e ineficiente, trabalhando em benefício dos próprios servidores públicos, em especial uma minoria que ganha altos salários e benefícios”, conclui Bretas.
Calma e planejamento para ajustar as contas
Mestre em Economia e Finanças, o professor da Una Cleyton Izidoro é o mais otimista do grupo de economistas ouvidos pelo DC. “Neste momento, nós brasileiros precisamos ter calma e planejamento; o pior já passou e agora é só ajustar as contas e recuperar o País economicamente em 2022 e 2023”, diz Izidoro.
Ele destaca a economia mineira, que é beneficiada pelo fato de mineração, siderurgia e agronegócio – que têm um peso expressivo no PIB do estado – serem produtos de exportação. “Estamos melhorando cada vez mais, nosso mercado é o exterior, com um câmbio mais elevado e conseguimos trazer mais receita. São muitos projetos de retomada, com a expansão da mineração saindo do papel e o parque de inovação tecnológica crescendo de maneira exponencial”, comemora o professor.
“Estamos com redução do déficit público e o pagamento em dia dos servidores estaduais. Minas Gerais está no caminho certo”, continua. Para Izidoro, mesmo com a pandemia, o País já está se ajustando, ou seja, está retomando o crescimento, “ainda que com alguns soluços”, frisa. “Na minha visão o pior já passou. Agora é questão de pequenos ajustes de rota. O comércio volta a aquecer, novos empregos começam a ser gerados. Voltamos a uma normalidade”, acredita.
Nesse contexto, ele confia que a elevação das taxas de juros irá controlar a pressão inflacionária, que deve ficar dentro da meta do Banco Central. “Os juros elevados têm impacto direto no consumo das famílias e levam à redução e mudança de hábitos de consumo. Elas passam a priorizar alimentação, moradia e medicamentos, deixando em segundo plano moda e lazer”, analisa o professor.
Para ele, o brasileiro de maneira geral tem o costume de comprar e pagar de maneira parcelada. Sendo assim, aqueles setores que oferecerem condições de pagamento “facilitadas”, sentirão muito pouco a redução do consumo. Quanto à questão política, ele vê um peso muito grande na economia, principalmente pelas expectativas que as mudanças eleitorais geram.
“Precisamos nos unir enquanto população, deixar de lado esquerda e direita e buscar ir para frente. Somos uma nação de trabalhadores e batalhadores, juntos somos mais fortes”, aponta Cleyton Izidoro. “A economia é feita de pessoas e a retomada econômica está nas mãos da população. Os políticos são escolhidos por nós e temos a obrigação de escolher os melhores”, finaliza.
Fonte: Diário do Comércio