A trajetória de um ou uma atleta que brilha nas Olimpíadas é construída também a partir da relação com várias pessoas. O mesmo acontece nas empresas.
Está sendo difícil desgrudar os olhos da tela nas últimas madrugadas. O sono tem sido um pouco comprometido, mas a emoção de acompanhar uma vitória, uma superação, um show dado por um talento (ou muitos!) compensa. Da Rayssa Leal a Ítalo Ferreira, torcemos, vibramos e comemoramos as vitórias. Vitórias que, veja bem, são resultado de uma habilidade individual estimulada e desenvolvida por um trabalho em conjunto.
Afinal, a trajetória de um ou uma atleta que brilha nas Olimpíadas é construída também a partir da relação com várias pessoas: as referências que o/a inspiraram, a família que dá apoio e a equipe técnica que aprimora o desempenho. Da mesma forma, acontece em uma empresa.
Às vezes, temos a impressão de que os talentos na organização são superestrelas que se destacam da multidão e, por isso, brilham sozinhas. São autossuficientes, já nasceram prontas, não dependem de ninguém. Porém, não saber (ou não querer) trabalhar em equipe não tem nada a ver com ser um profissional fora da curva.
Você pode até desempenhar bem sozinho ou ter desenvolvido competências de autodesenvolvimento e de autogestão, mas mesmo um atleta que disputa modalidades individuais faz parte de uma equipe.
Isso porque vitórias são sempre conquistas partilhadas, da mesma forma que a celebração é coletiva. Aliás, não é esse sentimento de pertencimento e de orgulho que faz com que você pule do sofá e comemore uma vitória do Brasil em Tóquio?
Refletir sobre isso é importante para desmistificar algumas ideias sobre talentos, como, por exemplo, a de que alguém nasce assim. Na verdade, toda pessoa carrega em si o potencial para ser um talento, mas isso precisa ser desenvolvido — e desenvolvido constantemente.
Outro mito disseminado é o de que um talento não depende de ninguém, já que seu desempenho e sua capacidade estão muito acima da média.
Só que especialistas que estudam o universo do esporte sempre ressaltam a importância não só da estrutura adequada de treinamento, de bons treinadores e da vontade de praticar com determinação, mas de algo importantíssimo: o apoio social.
Aliás, existem estudos que mostram que o suporte financeiro da família ajuda (e muito!), porém o suporte emocional é mais decisivo e continua sendo relevante mesmo quando a pessoa já se consolidou como um atleta de alta performance, acumulando medalhas e títulos.
Se é verdade que o talento precisa de um time, também é verdade que um time precisa de talentos — no plural, e não um só! Essa frase pode soar muito óbvia, mas nem sempre o banal é realidade dentro das empresas.
A última pesquisa global da McKinsey sobre tecnologia e negócios, publicada em junho deste ano, listou sete grandes lições na pandemia relacionadas aos movimentos de transformações tecnológicas. E sabe qual foi a 3ª? Nas exatas palavras do artigo: “o talento continua sendo o Santo Graal das transformações tecnológicas – algo potencialmente valioso, mas difícil de executar”.
Um achado interessantíssimo é o de que as transformações focadas no desenvolvimento de talentos são mais significativas e mais frequentes justamente nas empresas de destaque.
A pesquisa mostrou que os entrevistados de organizações com alto desempenho são aproximadamente três vezes mais propensos a afirmar que buscaram uma estratégia focada em talentos nos últimos anos do que os entrevistados de organizações com desempenho inferior (41% versus 12%).
Falta de visão de longo prazo
Além disso, 42% dos respondentes consideram que as coisas no trabalho continuam como antes, ou seja, que não foram feitas mudanças substanciais no negócio no último ano, justamente por causa da dificuldade de encontrar os talentos dos quais precisam.
O surpreendente, contudo, é que mesmo sabendo da importância de investir em pessoas, muitas organizações parecem carecer de uma visão estratégica e de longo prazo sobre o assunto.
Isso porque os entrevistados acreditam que mais de 40% de sua força de trabalho precisará ser substituída ou treinada novamente para superar as lacunas de habilidades. No entanto, só 15% afirmaram que suas organizações planejam transformar a estratégia de talentos nos próximos dois anos.
Como, então, brilhar para além da arena olímpica se as empresas ainda não dedicam a atenção que deveriam à busca e ao treino dos talentos? Pode ser que, diferentemente do evento esportivo em Tóquio, o jogo não tenha sido retomado para muitas organizações.
Pode ser que várias ainda estão se recuperando de um período tão difícil. Mas meu conselho para as organizações, independentemente do porte e do setor, é: torne o desenvolvimento de talentos um projeto prioritário e constante. Para subir ao pódio, que no jogo dos negócios não tem lugar só para ouro, prata e bronze, você precisará deles.
E para os talentos, o conselho que deixo é simples, mas importante: ninguém chega a lugar algum sozinho. Uma vitória que dá orgulho, que enche os olhos de lágrima e que faz o coração bater mais forte é sempre coletiva!
O ano de 2020 exigiu muita resiliência, impôs várias mudanças, deixou diversas marcas e adiou inúmeros projetos. A organização das Olimpíadas de Tóquio e os atletas que o digam.
Fonte: Exame