Com Pix, bancos conhecem todos seus hábitos de consumo, e isso vale ouro, diz criador da tecnologia.
Gilson Magalhães, presidente da Red Hat Brasil, empresa criadora da tecnologia do Pix, diz em entrevista exclusiva na série UOL Líderes que, com a nova tecnologia, a informação vale ouro, pois os bancos têm acesso aos hábitos de consumo de seus clientes.
Ele conta que o Pix é uma tecnologia usada há algum tempo, mas em poucos países ela é coordenada pelo Banco Central, como é o caso do Brasil.
O executivo afirma que a tecnologia do Pix é segura e confiável e os problemas que aconteceram até agora são de menor porte, mas faz um alerta: as pessoas devem proteger seus dados e prestar atenção às permissões de acesso a informações quando fazem transações no mundo digital.
Magalhães comenta também os problemas na educação brasileira e por que precisamos esperar para ter o 5G com segurança.
De olho nos dados das pessoas
UOL – Qual é o negócio da Red Hat?
Gilson Magalhães – Somos uma das mais importantes tecnologias do planeta. Vendemos um software que, em tese, é grátis.
Mas como vocês monetizam o negócio vendendo um produto grátis?
Criamos um software que tem suporte 24 horas e 7 dias por semana. Damos manutenção preventiva, corrigimos erros em tempo recorde e garantimos que o software fique conectado o tempo todo.
Quais são os projetos que vocês têm hoje no Brasil e o que pode destacar?
Estamos praticamente em todas as indústrias, na maioria dos bancos, em muitos projetos do governo, entre eles, a tecnologia do Pix.
Essa tecnologia foi criada do zero ou foi inspirada em alguma outra?
Ela é inspirada em outras tecnologias e faz parte de um debate da própria indústria financeira, que é o pagamento instantâneo. Isso para um país como o nosso é sensacional porque há um índice de não bancarizados muito elevado.
Com o Pix, respeitando as leis de proteção, o banco tem acesso às informações de consumo, hábitos das pessoas. Esses dados podem ser usados, de forma regulada, para determinar novos negócios, [revelar] as praças mais aquecidas para um determinado tipo de demanda. A informação vira ouro.
Pagamento será digital
UOL – Como funciona a tecnologia do Pix?
Gilson Magalhães – O Banco Central resolveu entrar no negócio de meios de pagamento e levar uma alternativa para o cidadão brasileiro de baixíssimo custo. O processo é rápido e seguro.
O potencial dessa tecnologia é extraordinário. Em breve, iremos à praia e o vendedor de coco terá apenas um QR Code. O pagamento será transferido automaticamente sem que seja necessário levar dinheiro à praia. Na China, há a possibilidade de um mendigo usar o QR Code para receber esmola.
Há outros países que utilizam a tecnologia do Pix?
O Pix é uma tecnologia usada há algum tempo, mas patrocinada por um Banco Central e gerenciada desta forma são poucos países do mundo. Nós, de fato, estamos à frente.
É um sistema seguro? Há relatos de problemas enfrentados nesse início de operação.
No Banco Central, o sistema é absolutamente seguro. A transação chega e é possível garantir que não houve duplicidade, mas, quando a mensagem vai para o agente [banco], pode haver algum tipo de problema técnico ou discrepância porque o modelo está em amadurecimento.
Os bancos estão aprendendo progressivamente, gerando novas versões, e aos poucos esses erros são reduzidos.
Informação é mais importante que petróleo
UOL – O open banking, com toda a abertura de dados dos consumidores, não é prejudicial à segurança das pessoas?
Gilson Magalhães – A população precisa ser educada. A Lei de Proteção de Dados do Brasil é moderna, inteligente e, se aplicada, protege, mas precisa ser fiscalizada.
O mundo está vivendo um momento extraordinário do uso de tecnologia, mas arriscado. Ele é muito bom e é sem volta. O risco do mau uso dos dados existe e a recomendação é ter cuidado. É importante saber exatamente o que está cedendo para aquela empresa na internet, porque o dado é o tesouro do futuro e as pessoas não entendem quanto é precioso, é mais do que o petróleo jamais foi.
Com tantos problemas na educação básica brasileira, como educar a população para uma tecnologia tão avançada como a do Pix?
A tecnologia da informação deixou claro que irá transformar o futuro e nós precisamos liderar ou estaremos condenados a sermos liderados. Nunca foi tão grande o fosso digital. O novo currículo das crianças deve incluir lógica, programação de computação. O software passa a ser mandatório no currículo e no aprendizado das crianças.
5G desafia todas as estruturas de tecnologia
UOL – Como anda a implantação do 5G no país? Não estamos atrasados em relação ao resto do mundo?
Gilson Magalhães – Essa tecnologia exige trocar tudo o que temos. Ela desafia as estruturas porque a velocidade é muito alta e necessária uma infraestrutura para trafegar os dados compatíveis com o que virá do usuário.
Não é apenas uma ou duas vezes mais rápida do que a 4G, a escala é muito maior. Não é simplesmente substituir a antena. Com essa velocidade, a avenida para o carro autônomo, para a internet das coisas, para os sensores e o drones automáticos estará pronta. É uma questão de preparar essas pistas tecnológicas.
O Brasil até que está avançado, mas é preciso ter segurança. Imagine sensores captando tudo, saber por onde as pessoas circulam, em que lojas vão, quando vão. Se alguém tiver acesso a todas essas informações, terá o domínio sobre praticamente todas as indústrias.
Não acredito que estejamos atrasados. Há [no mundo] experimentos locais, em ambientes ou cidades. Não tenho notícia da predominância do 5G em algum lugar.
Não há politização?
Não creio. O debate necessário. São muitas questões, como as tecnológicas, regulatórias, de comportamento.
Fonte: Uol