Só a parte fixa do rendimento do FGTS, de 3% ao ano, já supera tranquilamente o retorno de investimentos atrelados à Selic, que está em 2,25% ao ano
O calendário de pagamento do saque emergencial do FGTS começou nesta semana. E se antes o fundo de garantia rendia menos que a poupança e especialistas eram praticamente unânimes em recomendar o saque a cada oportunidade que o cotista tinha, hoje o quadro é diferente. Atualmente, o retorno do FGTS supera com folga o da caderneta e também o de boa parte dos investimentos de renda fixa mais conservadores.
Com a queda da taxa de juros básicos da economia, a Selic, para os atuais 2,25% ao ano, apenas a parte fixa do rendimento do FGTS já supera a taxa básica, que é a principal referência sobre o rendimento das aplicações de renda fixa do mercado.
Ainda não é possível cravar a rentabilidade do FGTS em 2020 porque não se sabe qual será o percentual de distribuição do lucro do fundo. Na sua última reunião, em junho, o Conselho Curador do FGTS oficializou o veto do presidente Jair Bolsonaro à MP 889/2019, que aumentava de 50% para 100% o repasse do lucro do FGTS aos cotistas.
Assim, o lucro distribuído voltou a ser parcial e o percentual a ser repartido com os trabalhadores passa a ser definido anualmente, de acordo com a saúde financeira do fundo. Segundo o Conselho, o percentual exato será informado na próxima reunião, dia 07 de julho.
Conforme explicado no vídeo, se o lucro distribuído voltar a ser de 50%, e o resultado for similar ao dos anos anteriores, o rendimento do FGTS em 2020 deve ficar próximo de 4,5%.
Quem paga mais?
Diante dessa possível remuneração, o professor de finanças do Insper, Michael Viriato, defende que o FGTS virou uma das melhores aplicações de renda fixa do mercado. “É um investimento seguro, como se você aplicasse Tesouro Selic, rodando a 3% ao ano, isento. Hoje o Tesouro Selic paga 2,25% e ainda tem o Imposto de Renda, que o FGTS não tem. E o risco dos dois é igual, que é o risco do governo”, diz.
Mas vale lembrar que a perspectiva é de que a taxa Selic volte a subir a partir do ano que vem, reduzindo novamente a vantagem do FGTS. Por isso, títulos de longo prazo, que refletem não só os juros atuais, mas embutem a expectativa de juros durante todo o período do investimento, estão com taxas maiores. É o caso do Tesouro Prefixado 2026, que está pagando uma taxa de 6%, e o Tesouro IPCA com vencimento em 2035, que está pagando 4% ao ano mais a inflação (medida pelo IPCA).
“Tudo depende de como você quer encarar o dinheiro do FGTS. Ao comparar com títulos de baixo risco, como poupança e Tesouro Selic, aí o FGTS vai pagar mais. Mas ao comparar com títulos de prazos mais longos, você provavelmente vai ganhar mais saindo do FGTS, mas esses investimentos são mais arriscados e podem gerar perdas se forem vendidos antes do vencimento”, diz Viriato.
Ele argumenta que o grande problema é que muita gente tira o dinheiro do FGTS para aplicar na poupança – uma péssima troca, já que a caderneta hoje rende 1,57% ao ano. “Existe uma discussão sobre o governo ser paternalista e não permitir que os cotistas movimentem o dinheiro do FGTS, que é deles. Nessa linha, faz sentido a pessoa sacar e ter a liberdade de escolher onde investir, mas infelizmente a realidade é que a maioria tira o dinheiro para colocar na poupança ou gastar”, diz Viriato.
Mas se o cotista tiver algum conhecimento sobre o mercado e estiver disposto a correr mais risco, Arthur Vieira de Moraes, professor de finanças do Ibmec, afirma que é possível superar a rentabilidade do FGTS tranquilamente. “De fato, não é um dinheiro para pegar e gastar livremente, é uma ferramenta de valor, mas quem tem disciplina e aceita um pouco de risco consegue ganhar mais de 3% fácil. Os próprios títulos públicos de prazo mais longo estão com taxas que chegam a mais de 6%”, diz.
Moraes acrescenta que o FGTS não é tão conservador assim e também tem sua dose de risco, já que apesar de parte da sua remuneração ser fixa (os 3% ao ano não mudam) outra parte é variável (TR e lucro variam). Nesse sentido, uma alternativa parecida, mas mais rentável, segundo ele, seriam os fundos multimercados, que investem em ativos de renda fixa e variável.
Moraes pondera ainda que, apesar do bom momento do fundo, sua atratividade pode ser passageira. “Tem algo de estranho no fato de o FGTS ser tão rentável e isso é uma anomalia, não vai durar por muito tempo por dois motivos: ou as taxas do mercado financeiro vão subir, ou em algum momento a regra do FGTS vai mudar, assim como o governo já mudou as regras da poupança antes”.
Se o objetivo for resgatar o dinheiro para pagar dívidas, contudo, a situação é bem diferente. Nesse caso, ambos os especialistas concordam que não há muito o que raciocinar: como os juros das dívidas são imensamente maiores do que o retorno do FGTS, não faz sentido abrir mão de abater um empréstimo com taxas altas para ganhar taxas muito menores no fundo de garantia.
Fonte: Infomoney
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